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Bitcoin e ações: a crise que afetou cripto e mercado financeiro

Não faz muito tempo, o Bitcoin era visto como um ativo que poderia diversificar investimentos de forma definitiva. Acreditava-se que ele era imune a oscilações do mercado acionário. Pesquisas iniciais, como as de Liu e Tsyvinski, mostraram que, nesse cenário, as criptomoedas apresentavam uma exposição baixa a fatores de risco comumente encontrados nas ações, títulos e moedas. Os retornos dessas moedas digitais eram influenciados mais por aspectos próprios do mercado cripto, como o momentum e a atenção dos investidores.

Mas a situação mudou. Hoje, uma série de estudos indica que o universo das criptomoedas e das ações está mais interligado do que nunca, especialmente em momentos de crise. Para quem acompanha o mundo das fintechs, a mensagem é clara: cripto não pode mais ser visto como um ativo “fora do sistema”. Agora, ele se comporta de forma semelhante a empresas de tecnologia, apresentando altos e baixos intensos.

De “não correlacionado” a “mais um ativo arriscado”

Uma pesquisa recente conduzida por Adelopo e seus colegas analisou como criptomoedas se relacionam com mercados financeiros tradicionais. Eles notaram que a correlação entre esses ativos varia ao longo do tempo e é especialmente forte durante eventos macroeconômicos ou geopolíticos significativos, como a pandemia de COVID-19 e a guerra entre a Rússia e a Ucrânia.

Outros estudos focados em ações do setor de tecnologia e empresas ligadas à blockchain reforçam essa conexão. Por exemplo, Umar e colaboradores descobriram que os mercados de criptomoedas e o setor tecnológico apresentam uma forte interdependência. Frankovic, por sua vez, mostrou que as empresas australianas relacionadas a criptomoedas tendem a sofrer impactos significativos devido às flutuações dos preços dessas moedas. Resumindo, as ações de empresas listadas agora funcionam como um canal que transmite o risco associado às criptomoedas.

O que as evidências mais recentes mostram

Recentes investigações deixaram claro que existe uma interconexão forte entre cripto e ações:

  • Transbordamentos globais: A pesquisa de Vuković demonstrou que choques negativos no mercado de criptomoedas têm efeitos prejudiciais em mercados acionários, títulos, taxas de câmbio e índices de volatilidade em vários países, não só nos Estados Unidos.

  • Co-movimento ações-cripto: A análise de Ghorbel e seus coautores revelou que as criptomoedas agora atuam como emissores e receptores de choques, especialmente em momentos de turbulência.

  • Mercados acionários dos EUA e da China: Lamine e equipe identificaram interrelações significativas entre ações dos EUA, da China, e as criptomoedas, demonstrando que choques no setor cripto influenciam diretamente esses mercados.

  • Contágio em bolsas: Sajeev e seus colegas documentaram como o Bitcoin pode impactar grandes bolsas de valores.

Até o FMI já alerta para essa interação. Em um documento sobre a influência entre cripto e mercados acionários, concluiu-se que choques do Bitcoin poderiam explicar de 6% a dois dígitos da variação na volatilidade global das ações. E essa influência vem aumentando à medida que os mercados evoluem.

Por que tecnologia e cripto agora se movem juntas

A grande pergunta é: por que o Bitcoin se comporta como uma ação de tecnologia de alto risco?

  • Duração e sensibilidade a juros: Tanto criptomoedas quanto ações de crescimento dependem de expectativas sobre fluxos de caixa futuros. Quando as taxas de juros aumentam, ambos os setores sofrem.

  • Base de investidores e alavancagem: Estratégias de negociação populares, como o uso de derivados, são comuns em ambos os mercados. Isso significa que um movimento em um mercado pode aumentar as flutuações no outro.

  • Construção de portfólio institucional: Cada vez mais, empresas estão inserindo criptomoedas em suas carteiras. Dessa forma, seus retornos passam a estar diretamente ligados ao posicionamento de outros ativos. Quando as instituições decidem reduzir riscos, tudo que está no “cesto arriscado” é afetado.

Implicações para portfólios e gestão de risco

Quando se trata de montar um portfólio, a mensagem é clara, embora um pouco desconfortável:

  • Em períodos calmos, as criptomoedas ainda podem servir como uma boa diversificação.
  • Mas em tempos de crise, as correlações aumentam, fazendo com que a diversificação perca valor.
  • O Bitcoin e as principais altcoins estão se comportando menos como “ouro digital” e mais como reflexos do sentimento de risco global.

Isso não significa que as criptos sejam um mal investimento, mas sim que a ideia de ter 5% a 10% em cripto como um bônus não correlacionado não é mais justificável.

Olhando para o futuro, pesquisadores e profissionais estão se perguntando se produtos como ETFs e maior adoção institucional vão aprofundar ainda mais essas ligações, ou se novos usos práticos poderão trazer de volta características mais individuais ao mercado cripto. Por enquanto, a tendência é clara: quando os mercados enfrentam dificuldades, as criptomoedas estão no meio da agitação.

Rafael Cockell

Administrador, com pós-graduação em Marketing Digital. Cerca de 4 anos de experiência com redação de conteúdos para web.

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